quinta-feira, 1 de setembro de 2016

Reflexões Sobre o Símbolo - Thomas Merton



O VERDADEIRO SÍMBOLO

"Ao tratar do simbolismo, entramos em uma área onde a reflexão, a síntese e a contemplação são mais importantes do que a investigação, a análise e a ciência. Não se pode apreender um símbolo, a menos que sejamos capazes de despertar, no próprio ser, as ressonâncias espirituais que respondem ao símbolo não apenas como SINAL, mas como ‘sacramento’ e ‘presença’.

Não é preciso dizer que, quando aqui falamos de símbolo, estamos interessados apenas no sentido pleno e verdadeiro da palavra. Os meros símbolos convencionais, escolhidos mais ou menos arbitrariamente para representar alguma outra coisa, as imagens concretas que representam qualidades abstratas, não são símbolos no sentido mais elevado.


O verdadeiro símbolo não aponta meramente algum objeto oculto. Ele contém em si mesmo uma estrutura que, de alguma forma, nos torna conscientes da significação íntima da vida e da própria realidade. Um verdadeiro símbolo nos leva ao centro do círculo, não para outro ponto da circunferência. Um verdadeiro símbolo aponta para o próprio âmago de todo ser, não para um incidente no fluxo do vir a ser."





A VIVÊNCIA DO SÍMBOLO

"Deve-se, em parte, a perda do sentido do símbolo na sociedade científica e tecnológica a uma incapacidade de distinguir entre o SÍMBOLO e o SINAL INDICATIVO. A função do sinal é a comunicação e, antes de tudo, a comunicação de conhecimento factual ou prático. A função do símbolo não é a afirmação de fatos ou a transmissão de informação, nem mesmo a informação espiritual a respeito de verdades absolutas ou religiosamente reveladas. Um símbolo não ensina ou informa apenas. Nem explica.


É bem verdade que o conteúdo de um símbolo religioso é normalmente rico de verdade revelada ou espiritual. No entanto, a visão espiritual e a revelação não estão nos símbolos a fim de que alguém possa extraí-las do símbolo e estudá-las, ou delas se apropriar intelectualmente, isoladamente do próprio símbolo.

A verdade revelada torna-se concreta e existencialmente presente nos símbolos e é apreendida no símbolo e com ele mediante uma resposta viva do sujeito. Essa resposta desafia a análise exata e não pode ser descrita com precisão para alguém que não a vivencie autenticamente. A capacidade para tal experiência é desenvolvida por tradições espirituais vivas e pelo contato com um mestre espiritual, ou pelo menos com uma liturgia criativa e vital e uma doutrina tradicional."








IDENTIFICAÇÃO NÃO É IDENTIDADE!

"Quando se invoca o símbolo para COMUNICAR, ele necessariamente se restringe a transmitir o tipo de ideia ou informação mais trivial. O símbolo fica, então, reduzido à MARCA REGISTRADA ou à INSÍGNIA POLÍTICA, um mero sinal de identificação.

Identificação não é identidade. O 'carimbo de identificação' é realmente uma diminuição ou perda de identidade, uma submersão da identidade na classe generalizada. Os pseudo-símbolos do movimento de massa tornam-se sinais da pseudomística, na qual o o homem massificado perde o seu eu individual no vazio, realmente demoníaco, no pseudo-eu geral da sociedade de massa.


Os símbolos da sociedade de massa são pontos grosseiros e bárbaros de arregimentação para a emoção, para o fanatismo e para formas exaltadas de ódio disfarçado de indignação moral. Os símbolos da sociedade de massa são cifras na face de um vazio espiritual e moral."




MORTE DO SIMBOLISMO = MORTE DO HOMEM

"Visto que é pelo simbolismo que o homem está espiritual e conscientemente em contato com seu próprio eu mais profundo, com os outros homens e com Deus, tanto a 'morte de Deus' como a 'morte do homem' se devem ao fato de estar morto o simbolismo.

A morte do simbolismo é o símbolo mais eloquente e significativo de nossa vida cultural moderna. Como o homem não pode viver sem sinais do invisível, e como sua capacidade de apreender o visível e o invisível como uma unidade significativa depende da vitalidade criativa de seus símbolos, embora ele possa declarar não ter maior interesse por esse 'unir' (que é o sentido etimológico de 'símbolo'), o homem, não obstante, persistirá em criar símbolos, a despeito de si mesmo. Se eles não forem sinais vivos de integração criativa e de vida interior, tornar-se-ão sinais patogênicos, mórbidos e deteriorados de sua própria ruptura interior.


A solene vulgaridade, a natureza de fato, inconscientemente obscena e espiritualmente repulsiva de alguns 'símbolos' que ainda são considerados dignos de respeito pelas instituições e pelas massas (tanto no Ocidente capitalista como nos países socialistas) suscitou naturalmente o protesto total do artista moderno, que agora cria apenas antiarte e não-símbolo, ou então contempla, sem tremor e sem comentário, a suprema afronta espiritual dessas formas e presenças que o marketing e a afluência tornaram 'normais' e 'comuns' por toda parte."




"DEUS ESTÁ MORTO" = "O HOMEM ESTÁ MORTO"!

"A declaração de Nietzsche de que 'Deus está morto' é agora assumida, não sem seriedade, pelos profetas das tendências mais 'progressistas' da religião ocidental, que agora parece, em alguns lugares, ansiosa por provar sua sinceridade aos olhos de uma sociedade ímpia, por um ato de autodestruição espiritual.

Enquanto isso, artistas, poetas e outros, que se poderia supor terem alguma preocupação com a vida interior do homem, declaram que a razão pela qual Deus deixou de estar presente para o homem (portanto está 'morto') é que o homem deixou de estar presente para si mesmo e que, consequentemente, o verdadeiro significado da declaração 'Deus está morto' é realmente 'o HOMEM está morto'.


O fato óbvio da agitação material do homem e de seu frenesi exterior só serve para enfatizar essa falta de vida espiritual."



Fonte: Thomas Merton, "Amor e Vida", Martins Fontes 

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